[Resenha] «Elizabeth Costello», de J. M. Coetzee [Tradução de José Rubens Siqueira] (Companhia das Letras, 2004)


“O que já disse antes: que não posso me permitir acreditar. Que na minha profissão é preciso suspender a crença. Que a crença é um deleite, um luxo. Que atrapalha.” “É mesmo? Alguns de nós diriam que o luxo que não podemos nos permitir é a descrença.”

Elizabeth Costello está na minha lista de livros mais especiais já lidos até o momento. Trata-se de um dos romances do premiado autor sul-africano J. M. Coetzee, atualmente residente na Austrália. Publicado no Brasil pela Companhia das Letras, o livro tem 256 páginas, sendo traduzido por José Rubens Siqueira, também responsável por traduções de autores consagrados como Vladimir Nabokov, Kazuo Ishiguro e Salman Rushdie.

O romance apresenta a história de uma escritora por meio de oito conferências sobre literatura. A aposta de Coetzee é levar a metalinguagem ao limite, fazendo-nos admirar o atravessamento entre a autora fictícia e o autor real. Entre dilemas familiares, o cuidado com o filho, os desafios da escrita e reflexões sobre ficção, o livro me prendeu do início ao fim.

Cheguei a Elizabeth Costello devido a minhas leituras de Franz Kafka, um dos inúmeros autores citados ao longo da obra. Dois textos, em especial, reverberam nas falas de Elizabeth. O primeiro é o conto “Um relatório para uma academia”; o segundo, que aparece no desfecho do romance, é a parábola “Diante da Lei”. Em ambos os momentos, a personagem não somente comenta Kafka, mas parece assumir o próprio lugar daquele que fala à academia e, por fim, o lugar daquela que deseja atravessar uma porta, não necessariamente a da lei nem a que conduz à luz no fim do túnel.

Recomendo fortemente a leitura deste livro de Coetzee. E agradeço ao meu amigo Henrique, que foi quem primeiro me apresentou este autor.


REFERÊNCIA

COETZEE, J. M. Elizabeth Costello. Tradução de José Rubens Siqueira. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

[Resenha] «Coisa de Rico», de Michel Alcoforado (Todavia, 2025)


“O choque despertou meu interesse em responder à pergunta fundamental: o que faz um rico, rico no Brasil?” – «Coisa de Rico», de Michel Alcoforado (Todavia, 2025).

O livro Coisa de rico: A vida dos endinheirados brasileiros, de Michel Alcoforado, foi um dos importantes lançamentos da editora Todavia em 2025. Com uma escrita envolvente, o antropólogo brasileiro revela ao leitor o universo dos ricos e super-ricos no Brasil. São 240 páginas de trabalho etnográfico que fazem com que um tema, por vezes tido como “fútil”, presente nas revistas de fofoca ou em programas pitorescos da televisão aberta, passe agora pelo crivo das Ciências Sociais: “O argumento da tese faz sentido; trata-se de um fenômeno social facilmente identificável aos olhos dos presentes.”

Aprendemos com Alcoforado que os ricos brasileiros são ricos em relação a outros ricos. Um rico nunca se vê como rico. O maior medo dos ricos é o de ser pobre. A diferença entre ricos tradicionais e ricos emergentes. O poder imaginativo do dinheiro e os objetos distintivos da riqueza. E que até nomes como João Moreira Salles, um dos cineastas mais abastados do planeta, com fortuna estimada em 4,9 bilhões de dólares, considera-se “classe média”. O livro reacendeu em mim o interesse pela Antropologia, permitindo-me refletir sobre o quanto esse saber se faz necessário para a compreensão da realidade de nosso país.


REFERÊNCIA

ALCOFORADO, Michel. Coisa de rico: a vida dos endinheirados brasileiros. São Paulo: Todavia, 2025.

[Resenha] «Breve manual de estilo e romance», de Autran Dourado (Editora UFMG, 2003)


Literatura, como toda arte, é afinco, trabalho é amor, não se esqueça disso. Pode ser amor mal contrariado, pode doer muito, porém é amor. 

Por esses dias retornei ao livro Breve manual de estilo e romance. Isso se deu devido à visita de uma prima em minha casa. Ela, também amante dos livros, viu o livro de Autran Dourado e leu o último parágrafo do livro. Lembro que na hora pensei o quanto não havia gostado do livro. E que algumas opiniões do autor tinham me incomodado. Passei, então, a procurar por um trecho que comprovasse minha queixa. Escolhi a leitura desse breve manual devido à obrigatoriedade da escrita da tese para o meu doutoramento em Teoria literária. O caso é que identifiquei uma grande dificuldade em escrever. E passei, então, a consumir materiais que tratavam sobre a escrita, seja ela literária ou acadêmica. Logo, realizar um fichamento do livro viria a me ajudar a entender mais a obra. E relembrar da existência desse pequeno livreto me fez reavivar essa forma de estudo.

Passando pelo sumário, vi que o livro tinha algo de interessante a oferecer. Uma espécie de “como eu não vi isso antes?”. Naquele momento, afirmações como “Falo do que fiz e do que sei” e “O que se deve ler” (títulos de capítulos do livreto) devem ter me deixado incomodado pelo seu tom imperativo. Porém, ao reler o pequeno livro, com pouco mais de 70 páginas, me vi diante de conselhos que cultivavam a humildade, a persistência e a reescritura. É o caso da citação: “Literatura, como toda arte, é afinco, trabalho é amor, não se esqueça disso. Pode ser amor mal contrariado, pode doer muito, porém é amor”. (p. 57) Compartilho com você esse fichamento para que posso, além de conhecer a obra, estudar e incorporá-la onde for necessário.


REFERÊNCIA

DOURADO, Autran. Breve manual de estilo e romance. Belo Horizonte: UFMG, 2003.